Estrada das Mulatas tem nome alterado e homenageia escritora negra do Brasil | Neto Rossi

Decreto foi publicado nesta quinta-feira (17) pelo prefeito de Cotia, Rogério Franco; saiba mais

Estrada das Mulatas, em Cotia. Foto: Google imagens 


O prefeito de Cotia, Rogério Franco (PSD), publicou um decreto, nesta quinta-feira (17), que altera o nome da Estrada das Mulatas para Estrada Carolina Maria de Jesus, uma das primeiras escritoras negras do Brasil.

A via liga a Estrada de Caucaia do Alto com a Estrada do Morro Grande.

O nome Estrada das Mulatas foi decretado em 1981 pelo então prefeito Carmelino Pires de Oliveira.

BIOGRAFIA

Carolina Maria de Jesus nasceu em 14 de março de 1914, na cidade de Sacramento, em Minas Gerais, numa comunidade rural, de pais analfabetos.

Era filha ilegítima de um homem casado e foi maltratada durante toda sua infância. Aos sete anos, sua mãe a obrigou a frequentar a escola, depois que a esposa de um rico fazendeiro decidiu pagar seus estudos, mas ela interrompeu o curso no segundo ano, tendo já conseguido aprender a ler e a escrever e desenvolvido o gosto pela leitura.

MUDANÇA PARA A FAVELA DO CANINDÉ

Em 1937, sua mãe morreu e ela se viu impelida a migrar para a metrópole de São Paulo. Carolina construiu sua própria casa, usando madeira, lata, papelão e qualquer material que pudesse encontrar. Saía todas as noites para coletar papel, a fim de conseguir dinheiro para sustentar a família.

Em 1947, aos 33 anos, desempregada e grávida, Carolina instalou-se na extinta favela do Canindé, na zona norte de São Paulo — num momento em que surgiam na cidade as primeiras favelas — cujo contingente de moradores estava em torno de cinquenta mil.

Ao chegar à cidade, conseguiu emprego na casa do notório cardiologista Euryclides de Jesus Zerbini, médico precursor da cirurgia de coração no Brasil, o que permitia a Carolina ler os livros de sua biblioteca nos dias de folga.

Em 1949, deu à luz seu primeiro filho, João José de Jesus, o que fez que perdesse seu emprego. Teve ainda mais dois filhos: José Carlos de Jesus nascido em 1950 e Vera Eunice de Jesus nascida em 1953.

Ao mesmo tempo em que trabalhava como catadora, registrava o cotidiano da comunidade onde morava nos cadernos que encontrava no material que recolhia, que somavam mais de vinte. Um destes cadernos, um diário que havia começado em 1955, deu origem a seu livro mais famoso, Quarto de Despejo: Diário de uma Favelada, publicado em 1960.

Carolina Maria de Jesus assinando seu livro 'Quarto de Despejo em 1960. Foto: Wikipedia


DENÚNCIA SOCIAL

Sua voz ativa e atenta lhe conferiu relevância não apenas literária, mas também na política. Mulher negra, mãe solo e moradora de uma comunidade pobre, Carolina Maria de Jesus nunca deixou de retratar em seus livros problema sociais e de atribuir culpas a governantes do país já no início do século passado. Favelada e catadora de papel, narrou em seus escritos a vida dura que teve desde a infância.

Carolina foi publicada em mais de 40 países e traduzida para 14 línguas. Além de Quarto de Despejo,
a autora também publicou 'Casa de alvenaria' (1961), 'Diário de Bitita' (1986) e 'Meu estranho diário' (1996).

Além de instrumento de denúncia social produzido por alguém que efetivamente vivia nessas condições de vida devastadoras, suas mais de cinco mil páginas manuscritas, entre romances, contos, crônicas, poemas, peças de teatro, canções e textos de gênero híbrido, dotadas de estilo próprio, confrontam os ditames da tradição literária e da norma padrão culta da língua. 


Neto Rossi (@netorossi_1) é jornalista do Cotia e Cia e escreve nesta coluna
assuntos diversos sobre a cidade e a região
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